O fundamentalismo não é um exclusivo islâmico

1 – Naquele tempo andava em alta a fé e pouco estimada a cultura. Sobraçava a pasta, nesse remoto Ano da Graça de 1992, um simples «ajudante de ministro» de seu nome Pedro Santana Lopes, acolitado por dois sub-ajudantes, Maria José Nogueira Pinto e António Sousa Lara.

Coube a este último pronunciar-se sobre a obra «O Evangelho segundo Jesus Cristo», do «inveterado ateu» José Saramago que concorria a um prémio literário. Disse o pio, que Deus abandonaria nas trapalhadas da Universidade Moderna, que «A obra atacou princípios que têm a ver com o património religioso dos portugueses. Longe de os unir, dividiu-os» e, com tão clemente argumentação, o mullah Lara vetou o livro.

2 - «Tal como em 1499, são eles (os Dominicanos) que estão à frente da matança iniciada em 19 de Abril de 1506 em Lisboa. No decorrer de uma cerimónia religiosa na Igreja de S. Domingos, um homem que participava no culto, no momento em que o povo gritava «milagre» à vista de um resplendor que saía de um crucifixo, teve a ideia inoportuna de argumentar que se tratava apenas do reflexo de uma vela. Foi logo taxado de «Cristão-Novo», morto e queimado in loco. Dois frades dominicanos brandindo crucifixos excitaram os fiéis aos gritos de «heresia, heresia». Durante três dias a cidade esteve nas mãos dos amotinados, que pilhavam as casas, atiravam mulheres e crianças da janela à rua e acendiam por toda a parte fogueiras onde ardiam vivos e mortos». "Judeus e Cristãos-Novos", António José Saraiva (citação recebida de M.P.M)

3 – «A maior das falácias é achar que é a religião que está no centro destes eventos (e se fosse? O que é que mudava?) mas claramente uma recusa política da democracia e uma recusa cultural da tolerância, da liberdade, das diferenças» J. Pacheco Pereira (Público)

4 – A blasfémia é um crime medieval que hoje tem menos valor do que a liberdade de expressão, direito a que não devemos renunciar. Renunciar aos direitos conquistados na Europa, contra o clericalismo, é regressarmos ao fundamentalismo romano.

5 – Respondendo a um leitor que me chamou «racista» por ter escrito «O Islão não é a apenas uma religião estúpida, consegue ser também a mais hipócrita», respondo-lhe, em nome da liberdade e da sua defesa, que repudio igualmente as Cruzadas, a Inquisição, o Nazismo, o Estalinismo e todas os sistemas totalitários.

6 – Dizem-me que há um islão moderado. Não o vejo condenar Bin Laden, aceitar a separação da Igreja e do Estado, renunciar à sharia, admitir a igualdade dos sexos ou defender a Declaração Universal dos Direitos do Homem.

7 – Quando alguém diz defender a liberdade, mas..., sinto no uso da adversativa um velho conformismo com os demónios da censura, um temor reverente ao poder, uma capitulação perante a prepotência, a brutalidade e a força.

Comentários

Anónimo disse…
Dizem-me que há um islão moderado. Não o vejo condenar Bin Laden, aceitar a separação da Igreja e do Estado, renunciar à sharia, admitir a igualdade dos sexos ou defender a Declaração Universal dos Direitos do Homem.

Sabe porquê?
Esse Islão moderado não vende jornais.
Exemplo: A Associação Islâmica Francesa está na primeira linha a pressionar a libertação de reféns no Iraque, está na primeira linha a condenar o terrorismo, está na primeira linha a defender a liberdade de expressão quer agora nos catoons quer antes com a possibilidade as raprigas taparem a cabeça nas escolas (ou isso náo é liberdade de expressão?).

E como esses exemplos há muitos mais. Sabe que uma grande percentagem de soldados americanos no Iraque sáo Islâmicos?
O nome Mohamed Ali diz-lhe alguma coisa? Ou por acaso tb ele é um fanático? Os muçulmanos mericanos náo defendem a igualdade? náo defendem os direitos do homem? Não defendem, com a vida, o próprio país?

Náo os vê, porque vende mais uma notícia banhada em sangue do que uma banhada em si (esperança).

el sniper
Anónimo disse…
El_sniper:

Apesar de não subscrever a 100% o artigo pois parece-me um erro grave fazer referências religiosas nas constituições, deixo-lhe aqui o artigo de hoje do VPV:

Politicamente correcto
Vasco Pulido Valente



Nesta história das caricaturas muito gente se esforçou por provar a sua tolerância, o seu horror à xenofobia e o seu seriíssimo sentido das responsabilidades.

Com toda a incorrecção política, talvez seja bom ver onde nos levam as nossas virtudes.

Primeiro, a tolerância - devemos tolerar o islão. Isto à superfície parece óbvio. Mas pede uma pergunta: também devemos tolerar a intolerância do islão? A "Europa" respondeu que sim, mesmo à custa de se negar a si mesma. No tratado constitucional (felizmente falhado) evitou a palavra "cristandade".

Mais precisamente, rejeitou a sua natureza e a sua origem, em última análise a sua liberdade, para reconhecer ao islão um privilégio que a si própria não se reconhece. Como, de resto, na prática permite que as comunidades muçulmanas vivam segundo a sua lei e não segundo a lei geral, até quando se trata de direitos do indivíduo e, muito principalmente, da mulher. A tolerância não acabou por se tornar na defesa da intolerância?

Xenofobia significa aversão ou hostilidade ao que vem de fora, ao que é "estrangeiro". Para escapar à xenofobia - hoje um crime sem nome - temos de aceitar acriticamente o islão, como se a nossa cultura não fosse na essência uma cultura crítica?

Não ofender o sentimento religioso do próximo implica que se aceite como irrelevante ou inócua a sharia? Que se aprove, como coisa natural e permissível, qualquer fatwa contra qualquer ocidental que incorra na ira de qualquer imã? É, de facto, a nossa obrigação cívica e moral contemplar em silêncio e com respeito a sociedade da Arábia Saudita, do Irão ou do Afeganistão sob o regime taliban? A nossa virtuosa renúncia à xenofobia não acabou por se tornar na defesa do intolerável?

Falta falar da responsabilidade. Maomé foi um profeta, mas também foi um guerreiro, um conquistador e um soberano. A sharia trata extensamente de política. Uma autoridade como o ayatollah Khomeini disse um dia: "O islão é político ou não é nada." Tentar distinguir entre a guerra política e a guerra religiosa que o islão move ao Ocidente não passa de um sofisma. Não se pode dividir o indivisível. A jihad deriva directamente do Corão. E o terrorismo, material e psicológico, assenta numa base doutrinal sólida, que Bin Laden, por exemplo, frequentemente invoca. Que espécie de responsabilidade leva, então, o Ocidente a não "provocar" um inimigo declarado? Não se tornou ela na pior e mais perigosa irresponsabilidade?


Público, 10-02-2006
Anónimo disse…
A Constituição Europeia deve ser religiosamente neutra, mas politicamente comprometida.
Isso significa que os valores fundamentais da cidadania europeia
não podem ser eclipsados pelas religiões. Ora, sem liberdade de expressão não faz sentido falar, nos dias que correm, em cidadania europeia. Mais uma vez parabéns ao nosso Durão Barroso, por ter falado mais alto!

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