Domingo de Verão (crónica)


Veio quente este primeiro domingo de Agosto com os corpos a aliviarem-se da roupa e dos preconceitos, mais receptivos às hormonas do que aos pios ensinamentos.

As praias regurgitam de gente que, adorando o sol, procuram a sombra, divinizando a virtude se entregam ao vício, fazendo a apologia dos bons costumes se dão à relaxação, procurando nos corpos alheios o êxtase que o tacto, a visão e o paladar propiciam.

Não há conselhos pios, homilias devotas, jejuns ou penitências que refreiem a louca sofreguidão do amor, rolando por entre rochas através da areia, corpos fundidos num arrebatamento, línguas sequiosas em busca da transfusão de saliva que, em vez de os aquietar, excita, partindo em busca de outras descobertas e novos fluidos.

Andam os padres um ano inteiro a pregar a castidade, as delícias do Céu e os castigos de Deus e vêm as hormonas, como tsunami fortuito, a ofender a moral e os bons costumes. Ficam as sotainas a apanhar mofo com padres dentro, desertas as sacristias com a água benta a cultivar bactérias e as igrejas abandonadas ou como meros adereços para fotos de casamentos.

As religiões inventaram deuses avessos ao prazer, alérgicos ao sexo e à carne de porco, seres misóginos que desconheciam a psicologia humana e o êxtase dos sentidos. É por isso que cobrem de ridículo os seus padres a pregarem a moral para maiores de oitenta anos, enquanto nos cafés, esplanadas, jardins, campos e praias, corpos à solta partem à procura de outros, com mãos ágeis, olfacto atento, olhos vivos e paladar guloso percorrendo a geografia do prazer numa louca correria de quem sabe que é breve a vida e não se repete.
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(A publicar na próxima quinta-feira in SORUMBÁTICO)

Comentários

jrd disse…
Magnífico! Escreves como respiras.
JRD:

Falta-nos a juventude da década de sessenta em que quisemos mudar o País.

Outros o fizeram, apesar de tudo.

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