Poiares Maduro e os ‘sábios’ academismos…

Governo cria Conselho de Sábios para promover a concorrência entre ministérios. Só os melhores projectos vão ser financiados… link

Em Coimbra conta-se uma história sobre um petulante professor que de regresso de um evento científico o relatou do seguinte modo: ‘Bem, na dita reunião só sábios éramos 20!’…
Esta prosápia encaixa-se no anúncio de Poiares Maduro quando anunciou o tal ‘conselho de sábios’.

Não vamos escalpelizar, nem escrutinar, as individualidades que se vão agregar no tal ‘conselho’. Vamos, antes disso, equacionar o que nos pode acontecer enquanto formos governados com ‘academismos’ deste tipo.

O ‘academismo’ é, na política, o palco preferido da retórica vazia de conteúdo social e ao mesmo tempo a tentativa de veicular uma ideologia (qualquer que seja) assente num abusivo prestígio que a Ciência tende a conferir. 
Conduz muitas vezes ao desenvolvimento de ‘modelos experimentalistas’ que por regra pouca relação têm com a multifacetada realidade (política, social, económica e financeira). Culturalmente, e na sua génese, tem uma influência remota (embora profunda) confundindo-se com a Renascença, de traço florentino, berço de múltiplas ‘academias’ que substituíram as medievais corporações, funcionando como a espinha dorsal de toda a futura construção humanística que só a 'pouco académica' Revolução Francesa , alguns séculos mais tarde, viria a concretizar. 

Na política, os ‘academistas’ tendem a ser prolixos, ‘livrescos’, rebuscados, cultores das ‘variáveis’ incontroladas ou incontroláveis (nomeadamente na área económica e financeira) mas em termos decisórios pouco eficientes ou produtores de soluções com confusos discernimentos e resultados incertos. No seguimento destes ‘atributos’ tendem a exprimir-se numa linguagem hermética, fechada e tecnocrática, pouco explícita ou compreensíveis para o vulgar cidadão e são máquinas infernais de citar estatísticas, gráficos, projecções e viciados em obtusos estudos comparativos muitas vezes sobre realidades dispares.

Têm uma especial atracção pelo formalismo, muitas vezes acopulado a um tipo esclarecido que vai da arrogância ao autoritarismo e frequentemente debitam rebuscadas explanações teoricistas com pouca (ou nenhuma) aderência à praxis. São ‘especialistas’ em divagar sobre complexas questões, afundam-se na especulação, mas manifestam uma confrangedora dificuldade em encontrar respostas práticas e acertadas. Esgotam muito das suas capacidades em ciclópicos processos de investigação, dominados pelas mais puras e abstractas formulações. São inveterados 'construturores de cenários'.

Tudo isto serve para evidenciar que o grupo de 15 ‘sábios’ link constituído para assessorar o ministro Poiares Maduro (também um ‘académico’) é pouco ou nada representativo da sociedade civil que, no terreno, terá a incumbência de ressuscitar a economia fazendo os investimentos oportunos e adequados, possibilitar a criação de emprego e cuidar de desenvolver projectos produtivos e economicamente viáveis. 
Se fosse necessário um exemplo para ilustrar o que atrás se mencionou basta observar a lista de ‘sábios’ publicitada e verificar, p. exº., que não encontramos aí alguém ligado do 'mundo do trabalho' ou movimento sindical. 
Mas as insuficiências não se ficam por aqui...

Comentários

Agostinho disse…
A propósito do tal senhor professor que se gabava de “na dita reunião só sábios éramos 20!” fez lembrar-me a história verídica de um certo regedor no tempo da Grande Guerra que instado pelo poder municipal a fazer inventário dos solípedes existentes na freguesia zelosamente elaborou documento sem delongas nestes termos:
Ex.mo Sr Presidente da Câmara Xis, tenho a honra de informar V.Exa. que na freguesia há os seguintes solípedes: eu próprio, o senhor prior, o senhor professor B e senhor C (o freguês mais abastado das redondezas).
É por estas subtilezas do ego que as bestas, mesmo que involuntariamente, se dão a conhecer ao país.
Quanto à comissão de sábios do sr. Ministro poderá ser mais uma para produção de uns quantos relatórios, cheios de soluções e bonitas palavras que, de facto, não aquecem nem arrefecem.
Normalmente essa gente não sai dos gabinetes, dá-se por satisfeita com a perfeição das palavras: para haver pão tem de se descer à terra e regá-la com suor.
Também não acredito que deste "Conselho de Sábios" saia alguma coisa de jeito.
Tenho no entanto de lhes reconhecer uma virtude: não serão remunerados, ao contrário do "sabichão" Borges, que para aconselhar o governo na venda do país ao desbarato e na redução de salários - "uma urgência"! - se faz pagar a peso de ouro!

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