Clemente e a arte de bem referendar em toda a sela…


O actual bispo de Lisboa (provavelmente o seu ‘estatuto de patriarca’ estará comprometido) chegou à sua sede episcopal com a aura de ser 'homem dos tempos modernos’.
Todavia, o mundo está cheio de rasteiras e o seu ‘apostolado’ terá começado da pior maneira. O país assistiu atónito à manifestação política que rodeou a sua ‘entronização’ acabou por oferecer à sociedade no Mosteiro dos Jerónimos. link.
E a cerimónia do Jerónimos’ esteve muito longe de qualquer modernidade, mais se assemelhando a uma reposição do ‘antigamente’.

Adiante.
Ontem, na TVI, o prelado (re)aparece a intervir nas questões políticas e, em público,  defende o referendo sobre a adopção e a co-adopção de crianças por casais do mesmo sexo. E o argumento é que ‘os direitos das minorias devem ser referendados’. link.

Na verdade, a primeira questão que este ‘golpe baixo e rasteiro', da autoria do PSD, coloca é na representatividade, dinâmica e no prestígio parlamentares, mas será também uma importante questão constitucional , i. e., resta saber se um referendo deve (ou pode) pronunciar-se sobre ‘direitos, liberdades e garantais das pessoas’, qualquer que seja o seu estatuto quantitativo (minoritário ou maioritário).  
Existem, como sabemos, diversas interpretações, algumas ad hoc, outras levantando questões jurídicas, históricas e académicas, mas será o TC, com o acórdão que se aguarda, criar doutrina sobre esta questão (para uma interpretação do regime constitucional português). Que, como sabemos, e o 'aspirante a patriarca' também, privilegia a democracia representativa. E o entendimento mais prudente e equilibrado parece ser o de que a própria Constituição cria (tem) balizas sobre questões e conteúdos (que os direitos individuais serão um exemplo) e que não devem ser escamoteados ou contornados, sob pena de defraudar-se o conceito de ‘participação popular', por mais apego que tenhamos - em determinadas situações - pela 'democracia directa'. Não podem, como por exemplo já se verifica, existirem limites sobre o referendar de questões fiscais (cujos resultados são antecipadamente expectáveis!) e conferir aos direitos fundamentais, ou as liberdades individuais, um regime ad libidum, vulnerável. 
Por este caminho, poderemos chegar à total perversão constitucional e passar a referendar emendas avulsas à Lei Fundamental ao sabor de alianças circunstanciais, de preconceitos ocultos ou efémeros, de interesses conjunturais ou até de ‘estados de alma’. E é sobre este últimos 'estados' que o prelado é especialista, mas é sobre pessoas concretas que se pretende lançar o labéu de um referendo.
Antes disso, o presidente da CEP Manuel Clemente, decide, porém, pronunciar-se. Estará a jogar (a cavalgar) a sela predilecta da religião em Portugal. Isto é, a aproveitar o momento para jogar a sua ‘praxe' (praxis). Portugal sendo um povo tradicionalmente religioso (ou se quisermos católico) estaria disposto a transferir para o domínio legislativo e social as decisões hierárquicas congeminadas em Fátima. Neste caso sem direito a qualquer acto referendário.

Comentários

Bom post.

Como vinha publicar o meu sobre o mesmo assunto já o programei para amanhã.

O pensamento é o mesmo, só varia o estilo.

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